Ludismo foi um movimento radical de resistência operária que surgiu na Inglaterra durante o século XIX, no contexto da Revolução Industrial. Os ludistas eram trabalhadores do setor têxtil que protestavam contra os avanços tecnológicos proporcionados pelas máquinas. Sua forma de resistência consistia na quebra de máquinas nas fábricas. O termo “ludismo” deriva do nome de Ned Ludd, um operário que, revoltado com as péssimas condições de trabalho, destruiu uma máquina em sua fábrica. Apesar do radicalismo, o movimento contribuiu para o surgimento do sindicalismo.
Durante a primeira metade do século 20, um grande terror rondava a classe trabalhadora. Máquinas criadas para a automação e substituição do trabalho começavam a surgir. Durante a segunda metade do mesmo século, essas máquinas foram impulsionadas pela computação e ganharam ainda mais força. A resistência foi enorme. Enquanto massas de trabalhadores eram despedidos ao longo dos anos, uma negação da automação tomou forma. De diversas formas, pessoas tentaram barrar a automação de maquinário de produção, mas, ao fim, podemos declarar que foram derrotadas. Os ludistas não se saíram vitoriosos e provavelmente jamais saíram, a não ser em uma realidade distópica que precisamos lutar para estarem apenas em livros.
Tal período se exemplificou na extrapolação possibilitada pela arte. Não são poucas as produções que pegaram esse temor da automação e a traduziram em ficção cientifica. Diversos mundos imaginários em que as máquinas tomariam o lugar da humanidade foram criados.
Agora, na primeira metade do século 21 vemos o mesmo ocorrer.
Se antes eram as máquinas pesadas que automatizavam a produção nas fábricas, agora vemos máquinas muito mais leves e ainda mais poderosas automatizando o trabalho em escritórios. Não se precisa falar muito sobre o avanço das inteligências artificiais nos últimos anos, já que a mídia e as redes sociais andam falando muito nisso.
A partir desse avanço, se iniciou um movimento muito parecido com o ocorrido no século anterior. A negação misturada com o medo vem tomando conta de diversos setores da sociedade, principalmente entre aqueles que veem o seu trabalho e garantia de renda sendo ameaçadas.
Se o século 20 nos ensinou algo, é que a disputa contra os avanços das tecnologias de produção vai nos levar a derrotas. Ao resistirmos, apontamos nossas armas para a tecnologia em si e não para aqueles que as detém e estão apenas norteados pela perspectiva do lucro que a substituição de humanos por máquinas pode gerar.
Logicamente, há de se fazer críticas ao emprego de Inteligências Artificiais, mas são críticas direcionadas a quem detém o poder capital sobre elas. Por exemplo, é impossível se negar que a arte industrializada irá se utilizar de IAs para potencializar seu lucro, mas a arte deveria ser uma indústria? Dentro do nosso modo atual de vida e produção, é impossível imaginar a arte não industrializada, mas é impossível imaginar outro modo de vida e produção?
Processos como os da China podem servir de exemplo de como lidar com esse momento de uma forma que potencialize o desenvolvimento humano e não nos jogue em um abismo de uma população cada vez mais desempregada. O país oriental não se concentra na negação de avanços tecnológicos, mas se concentra em pensar como tais avanços podem ser empregados sem ocasionar a ruína de humanos. Quando uma automação está pronta para ser empregada, antes é necessário realocar os trabalhadores que serão substituídos, seja com formações em outras áreas, serviços sociais, aposentadoria ou mesmo manutenção de cargos até suas idades de aposentadoria.
Brigarmos contra a automação nos moldes capitalistas sem pensar em como modificar esses moldes é inútil. Seremos atropelados enquanto continuamos chorando em redes sociais com indiretas sobre quem está apenas jogando o jogo por suas regras, ignorando a necessidade de modificar tais regras. E ainda mais pensamentos me vem: como utilizar as armas do jogo atual contra ele mesmo?
Por mais que façamos como Ned Ludd e destruamos a máquina, os donos apenas comprarão outra. Mas, assim como o ludismo impulsionou o sindicalismo, um movimento de crítica a como as IAs vem sendo implementadas pode sim ressoar em ganhos concretos à população trabalhadora, caso as críticas sejam direcionadas à organização que potencialize a superação do jogo em que estamos no momento e não apenas a imaginação de uma realidade de fantasia em que barraremos os avanços das tecnologias de produção, algo feito, vejam só, pela indústria cinematográfica de Hollywood, por exemplo.
Gosto muito de uma frase que não me recordo do autor. Ela já se tornou parte da sabedoria popular:
Nós passamos por um período de grandes mudanças… Como sempre.