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O Solucionismo Tecnológico nosso de cada dia

  • Categoria do post:Análise

Evgeny Morozov é um economista bielorruso que debate temas ligados à tecnologia há muitos anos. O acompanho há pelo menos 10 anos e, além de me assustar com o quanto ele é jovem (atualmente tem 39 anos), também me assustei desde o começo em perceber em mim mesmo o comportamento que Morozov cita como uma ideologia do Neoliberalismo: O Solucionismo tecnológico.

O Solucionismo Tecnológico é citado por Morozov como uma ideologia presente no capitalismo durante a arquiquetação do neoliberalismo. Resumindo bastante, o escritor bielorrusso aponta que o grande capital vem tentando ignorar os seus problemas a partir da premissa de que tudo pode ser resolvido com tecnologia. Como toda ideologia, ela impregna também toda a classe trabalhadora, onde eu me incluo, e os movimentos populares.

Exemplificando em alguns pontos como o solucionismo tecnológico se coloca em nossas vidas, segue abaixo alguns pontos facilmente perceptíveis que vão desde temas globais até questões pessoais:

  • Existem problemas com abastecimento de água no continente africano? Pra que discutir questões como a necessidade no investimento em infraestrutura nos países do continente ou mesmo fazer o debate sobre o uso imoral da água pelas industrias de mineração e agricultura? Por que discutir e lidar com os impactos nefastos do colonialismo e da escravidão? Basta criarmos um equipamento que transforma urina em água potável.
  • Estamos apresentando cada vez mais doenças do sono e problemas para dormir? Pra que discutir temas como a saúde mental estar cada vez mais debilitada graças a trabalhos e vidas cada vez mais desgastantes ou por conta das mudanças causadas por enxurradas de informação e telas em nossas vidas? Basta baixar um jogo que vai te dar um Pokémon bonitinho se você dormir bem.
  • O transporte público apresenta problemas de qualidade e o tempo de locomoção dentro de uma cidade não é nada saudável? Para que debater temas como a criação de cidades que reduzam o tempo de trânsito por meio de um projeto inteligente de distribuição de serviços, lazer, trabalho e outros? Para que debater a necessidade de estatização total do transporte, uma política de caronas ou regulações mais pesadas sobre transportes individuais? Basta criar aplicativos de transporte como o 99 e o Uber e o problema estará resolvido.
  • Nada de terapia ou de conversamos sobre como a sociedade modula a nossa identidade. Anunciamos que todos os seus problemas de autoestima e falta de amor próprio estão há um Instagram de serem resolvidos!
  • O mundo está aquecendo e estamos próximos de uma extinção em Massa da Humanidade??? Não vamos debater o modelo de produção e o estimulo cada vez maior ao consumismo, não! Basta colocar um espelho na frente do Sol ou, quem sabe, jogar alguns componentes químicos no ar que o Planeta irá desaquecer.
  • Problemas na organização da sua equipe de trabalho? Pra que debater sobre dinâmica, conceitos de entrega, objetivos em conjunto e individuais? Pra que debater métodos de avaliação e de construção realista de objetivos e metas? Basta adotar esse “novo-velho” aplicativo que vai resolver todos os seus problemas e potencializar sua equipe! (Nessa eu, como coordenador de equipe de Tecnologia da Informação, já cai mais do que uma vez).

Enfim. Esses e outros tantos exemplos são derivados do que Evgeny Morozov define como Solucionismo tecnológico e, assim como toda ideologia do capitalismo está presente em nossa vida cotidiana e também nas decisões políticas que tomamos diariamente.

A grande maioria dos problemas depende de uma ampla reestruturação da forma como vivemos, produzimos, reproduzimos e consumimos. Seja um produto, seja um conteúdo.

Longe de diabolizar a tecnologia, que pode ser uma ferramenta para diversas mudanças que precisamos fazer e desafios que precisamos superar. Porém encarar a tecnologia como uma solução em si para os problemas da humanidade e do ser humano não é nem de longe uma boa ideia.

Além dos riscos empregados em mexermos com algo que não entedemos, como no caso da geoengenharia, nossa história e, principalmente nosso presente, tem apontado as limitações e grandes problemas causados pelo uso da tecnologia sem que haja um debate sociológico coletivo por trás desse uso.

Durante os últimos anos, temos aplicado apenas o uso pelo uso, colocando a solução dos nossos problemas em alguma tecnologia nova, mirabolante e milagrosa, enquanto nos furtamos de pensar em como coletivamente podemos resolver nossos problemas.

Novas e velhas tecnologias podem ser parte integrante e até essenciais dessas soluções, mas quando encaradas como ferramentais de uma solução e não como uma solução em si.

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